O SISU –
Sistema de Seleção Unificada, foi criado pelo Ministério da Educação – MEC para
centralizar a distribuição das vagas da Instituições de Ensino Superior – IES públicas,
com base nas notas do Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM.
O SISU funda
sua existência em certos argumentos, dentre os quais, com base em alguns dados reais, de que democratizaria
o processo de distribuição das vagas nas IES públicas, federais ou estaduais. A
parte correta deste discurso está no fato de que, realmente, boa parte dessas
vagas eram ocupadas por alunos de classes sociais elevadas, que “poderiam pagar
pelos seus estudos”. A parte equivocada é que, pelo fato de não haver uma
educação básica que garanta a todos, independentemente de classes sociais,
iguais condições para fazer as provas do ENEM, essa democratização se torna uma
falácia.
Antes de
discutir o SISU e o ENEM, cabe fazer um breve destaque sobre a forma
manipulativa com que tem sido tratadas algumas questões de ordem social,
econômica, religiosa, dentre outras. Não temos, no Brasil, uma Constituição
para as diferentes classes, ou categorias sociais. Não temos serviços públicos
para pobres e outros para ricos. Se a distribuição das vagas das IES públicas
privilegiava as classes mais elevadas e, se existe um vilão nessa história,
este se encontra na educação básica.
Antes que me
acusem de ser um defensor das classes privilegiadas, quero registrar que, em
minha época, como adolescente nascido e criado em um pobre município da Baixada
Fluminense do Rio de Janeiro, sofri aos montes para passar no vestibular (1997)
– último vestibular unificado da Fundação CESGRANRIO, conseguindo uma vaga para
o curso de Matemática na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
Após entrar na
faculdade, percebi sim que havia diferenças sociais grandes, principalmente
para os cursos mais badalados, tais como os de Engenharia, Veterinária e Agronomia.
Mas percebi também que a parte “fácil” teria sido entrar na faculdade. O
difícil ainda estaria por vir, que era sobreviver física, psicológica e
academicamente.
No contexto da
época, não que hoje seja tão diferente assim, encontravam-se as IES públicas em
um estado de sucateamento bastante grande. Alojamentos sem estrutura mínima, bandejões
(Restaurante Universitário) disponibilizando uma alimentação de péssima
qualidade (minha gastrite fica atacada sempre que me lembro do bandejão),
bibliotecas sucateadas etc. Mesmo não pagando mensalidades, havia um gasto
grande com alimentação, transporte, livros etc.
Para minimizar
os gastos, resolvi enfrentar os alojamentos e o bandejão, daí as dificuldades
de sobrevivência física. As dificuldades psicológicas surgem pela imposição do
desafio de sobreviver por quatro anos, nas condições narradas anteriormente, mantendo um certo distanciamento da família, visto que, sem as vantagens da
internet e da telefonia de hoje, somente era possível estabelecer contato com a
família em alguns finais de semana e nos períodos de férias, quando as
rotineiras greves possibilitavam tirar férias.
A
sobrevivência acadêmica não era menos pior, pois era comum ouvir dos professores
que, por ser aluno numa universidade federal, meus colegas e eu teríamos a
obrigação de ter todos os conhecimentos prévios, teoricamente trabalhados na
educação básica, para acompanhas às aulas, e que não iriam perder tempo tirando
dúvidas acerca de elementos basilares da disciplina.
Tendo
consciência das lacunas de formação básica, sabia que tinha que dar dois passos
para trás antes de dar um para a frente.
Considerando
que a educação básica não teve “melhoras” consideráveis de minha época para
hoje, as dificuldades dos atuais estudantes não serão tão diferentes.
Continuará
havendo um certo privilégio dos alunos mais bem preparados, ou treinados, para
o acesso às vagas nas IES públicas. Com o SISU, a disputa que era regional
passou a ser nacional, pois estudantes das regiões com os melhores sistemas
educacionais, seja da rede pública ou privada, disputarão as vagas com os alunos
de regiões menos privilegiadas.
Em 2013,
segundo dados do MEC, apresentados numa matéria publicada pelo G1 (disponível em:
http://g1.globo.com/educacao/noticia/2013/05/paulistas-sao-os-que-mais-papam-vagas-do-sisu-em-outros-estados.html),
15.671 jovens foram estudar em outro estado, o que representa algo em torno de
13% dos aprovados no SISU.
Desse total, 4.839
saíram de São Paulo, cujas IES estaduais - Universidade de São Paulo (USP),
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade Estadual Paulista
(Unesp), “têm vestibular próprio e oferecem, juntas, mais de 20 mil vagas, mais
que o dobro da oferta das instituições federais paulistas e um sexto de todas
as vagas oferecidas no Brasil durante o Sisu do primeiro semestre”.
Não podemos “entrar
na pilha” do discurso panfletário e começar a culpar os paulistas. Não foram
os estudantes que criaram as regras, eles apenas estão sabendo utilizá-las para
seu benefício, o que para mim será uma tendência a ser observada pelos próximos
anos.
Não precisaríamos
de SISU, sistema de cotas, dentre outras politicagens, se tivéssemos uma
educação básica de qualidade. Porém, como não a temos, essas políticas poderão
gerar alguns resultados, no entanto, menores do que os ditos em discurso.
Cabe mais um alerta. A expansão das vagas nas IES públicas, gerada principalmente
pelos incentivos do REUNI - Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e
Expansão das Universidades Federais, tem levado recursos financeiros para essas
instituições numa proporção menor que a do número de alunos. Ou seja, se por um
lado as IES públicas estão recebendo mais recursos financeiros, em valores
brutos, o investimento por aluno não acompanha a mesma proporção de antes.
Além disso, já
é visível a queda de qualidade do ensino nas IES públicas, que já não são mais
vistas como únicas, ou principais referências de qualidade na formação
superior.
Há pelo menos
cinco anos, eu fazia um exercício de futurologia com alguns colegas
professores, prevendo, em função dos movimentos gerados pelas políticas
públicas educacionais, essa queda de qualidade das IES públicas. Na época, eu
falei para os colegas que o cenário visto nas escolas públicas da educação
básica, em sua maioria, seria o mesmo cenário que perceberíamos, em cinco ou
dez anos, nas instituições públicas de ensino superior.
Espero estar
errado. Em verdade desejo estar certo, mas que o cenário seja de uma educação
pública, básica, superior ou profissional de qualidade para todos, independentemente
de credos, cores, raças, classes, gêneros, ou qualquer outro meio de
segregação.
Esta é a minha
opinião.
Abraços e até
breve.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe seu comentário!