domingo, 12 de maio de 2013

125 ANOS DE ABOLIÇÃO – FORMAL - DA ESCRAVATURA – 13/05/2013


   Amanhã, 13 DE MAIO DE 2013, o Brasil lembrará mais um ano da Abolição da Escravidão, ocorrida em 1888, pela chamada Lei Áurea.

   Como sabido, durante séculos, a atividade produtiva brasileira baseava-se na mão-de-obra escrava negra.

   Os escravos não tinham direitos, porque não eram considerados pessoas no sentido jurídico da palavra. Eram coisas, “semoventes” apenas.

  A partir do momento em que se tornou insustentável manter a escravidão no Brasil (do ponto de vista econômico, político e cultural), iniciou-se o processo de decretação de seu fim, através de leis que gradativamente promovessem a extinção deste tipo de mão-de-obra: lei que proibia o tráfico (1850), lei do ventre livre, lei dos sexagenários e, finalmente, a Lei Áurea. 

   Mas, como é evidente, uma lei, por si só, não seria suficiente para mudar a situação social e econômica dos (ex) escravos, nem a mentalidade de toda a população, nem impossibilitaria a criação de novas e modernas categorias de escravos. 



   Justamente porque a escravidão ainda é uma realidade, o Código Penal prevê – e, portanto, proíbe a escravização -, em seu art. 149, o crime de redução à condição análoga à de escravo:

Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto: 


Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência. 



§ 1o Nas mesmas penas incorre quem: 

I - cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho; 
II - mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho. 

§ 2o A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: 

I - contra criança ou adolescente; 

II - por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem. 




   A mão-de-obra trabalhadora escravizada é encontrada, em especial, no meio rural, embora haja registros de trabalhadores nesta condição em meio urbano, como o caso dos trabalhadores bolivianos mantidos em indústria têxtil, em São Paulo. O número de pessoas escravizadas é grande nos dados oficiais, como se infere dos números apresentados na edição de hoje do Correio Braziliense (pg. 8): é informado que desde 1995, foram libertados mais de 44.200 trabalhadores mantidos em condição de escravos, sendo que em 2013, até abril, foram libertadas 7.962 pessoas. Ainda temos, no entanto, informações escassas e os quantitativo real pode ser muito maior. 

Mas como esta conduta se caracteriza na prática? Vejamos duas decisões do STF – Supremo Tribunal Federal que exemplifica:

EMENTA 1

PENAL. REDUÇÃO A CONDIÇÃO ANÁLOGA A DE ESCRAVO. ESCRAVIDÃO MODERNA. DESNECESSIDADE DE COAÇÃO DIRETA CONTRA A LIBERDADE DE IR E VIR. DENÚNCIA RECEBIDA. Para configuração do crime do art. 149 do Código Penal, não é necessário que se prove a coação física da liberdade de ir e vir ou mesmo o cerceamento da liberdade de locomoção, bastando a submissão da vítima “a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva” ou “a condições degradantes de trabalho”, condutas alternativas previstas no tipo penal. A “escravidão moderna” é mais sutil do que a do século XIX e o cerceamento da liberdade pode decorrer de diversos constrangimentos econômicos e não necessariamente físicos. Priva-se alguém de sua liberdade e de sua dignidade tratando-o como coisa e não como pessoa humana, o que pode ser feito não só mediante coação, mas também pela violação intensa e persistente de seus direitos básicos, inclusive do direito ao trabalho digno. A violação do direito ao trabalho digno impacta a capacidade da vítima de realizar escolhas segundo a sua livre determinação. Isso também significa “reduzir alguém a condição análoga à de escravo”. Não é qualquer violação dos direitos trabalhistas que configura trabalho escravo. Se a violação aos direitos do trabalho é intensa e persistente, se atinge níveis gritantes e se os trabalhadores são submetidos a trabalhos forçados, jornadas exaustivas ou a condições degradantes de trabalho, é possível, em tese, o enquadramento no crime do art. 149 do Código Penal, pois os trabalhadores estão recebendo o tratamento análogo ao de escravos, sendo privados de sua liberdade e de sua dignidade. Denúncia recebida pela presença dos requisitos legais. (Inq 3412/AL; 
Min. Relator MARCO AURÉLIO
Julgamento: 29/03/2012) 


EMENTA 2 
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. ART. 149 DO CÓDIGO PENAL. REDUÇÃO ÁCONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO. TRABALHO ESCRAVO. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITOS FUNDAMENTAIS. CRIME CONTRA A COLETIVIDADE DOS TRABALHADORES. ART. 109, VI DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. A Constituição de 1988 traz um robusto conjunto normativo que visa à proteção e efetivação dos direitos fundamentais do ser humano. A existência de trabalhadores a laborar sob escolta, alguns acorrentados, em situação de total violação da liberdade e da autodeterminação de cada um, configura crime contra a organização do trabalho. Quaisquer condutas que possam ser tidas como violadoras não somente do sistema de órgãos e instituições com atribuições para proteger os direitos e deveres dos trabalhadores, mas também dos próprios trabalhadores, atingindo-os em esferas que lhes são mais caras, em que a Constituição lhes confere proteção máxima, são enquadráveis na categoria dos crimes contra a organização do trabalho, se praticadas no contexto das relações de trabalho. Nesses casos, a prática do crime prevista no art. 149 do Código Penal (Redução à condição análoga a de escravo) se caracteriza como crime contra a organização do trabalho, de modo a atrair a competência da Justiça federal (art. 109, VI da Constituição) para processá-lo e julgá-lo. Recurso extraordinário conhecido e provido. (RE 398041/PA; Min. Relator: JOAQUIM BARBOSA; Julgamento: 30/11/2006) 

Repare que a caracterização do crime exige condutas por parte do patrão que importem em ofensa à dignidade, que restrinjam a personalidade e liberdade do trabalhador, que o humilhem. 

Infelizmente, é cenário mais comum do que imaginamos, e apenas uma parte do quadro geral da escravidão contemporânea no Brasil chega até a nós. O conhecimento da prática escravizatória depende de denúncia, pois, é claro, é clandestina. A denúncia pode ser feita para a Delegacia Regional do Trabalho, podendo ser reportada também ao Sindicato de Trabalhadores da Região ou à polícia local.

Se quiser saber mais, veja o texto publicado na página do Senado intitulado TRABALHO ESCRAVO ATUALMENTE

Alice Soares

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Quem sou eu

André Luiz Monsores de Assumpção é matemático, educador, professor universitário e escritor. Mestre em Educação Matemática. Foi Coordenador dos cursos de Licenciatura em Matemática e Licenciatura em Pedagogia, Pro-Reitor de Graduação do Centro Universitário, Diretor Geral de IES e Gerente Acadêmico. Consultor educacional. Alice Soares Monsores de Assumpção é advogada, professora universitária e de cursos preparatórios para concursos, graduação e pós-graduação, assessora legislativa e consultora. Mediadora Judicial. Mestre em direito pela UERJ.